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A Royal Dutch Shell vai estabelecer metas de emissões de carbono para 2019 e relacioná-las à remuneração dos executivos. A decisão marca uma mudança de posição do executivo-chefe da companhia diante da intensa atuação de acionistas que pressionam as empresas de combustíveis fósseis a assumir maior responsabilidade por seu papel no aquecimento mundial.

Investidores como a Igreja da Inglaterra e a Robeco vinham pressionando a Shell para assumir compromissos firmes de redução de sua pegada de carbono, considerando que o anúncio feito em 2017, de uma “ambição” de longo prazo para reduzir as emissões de carbono pela metade até 2050, não ia longe o suficiente.

“[Ao criar metas] vamos sistematicamente reduzir nossa pegada de carbono com o tempo”, disse o executivo-chefe da Shell, Ben van Beurden, ao “Financial Times” no domingo. “Todos nós sabemos dos benefícios da energia, mas há efeitos associados que precisamos gerenciar.”

A Shell também anunciou que vai condicionar os planos de incentivos financeiros de altos executivos às metas de transição energética, o que vai depender de aprovação dos acionistas em 2020. A Shell ainda negocia com investidores quanto à porcentagem das metas, mas a remuneração dos 1,2 mil executivos poderia ser afetada.

“É uma enorme mudança de fase”, disse Adam Matthews, diretor de ética e engajamento do Church of England Pensions Board, órgão previdenciário da Igreja Anglicana. “Isso apresenta um modelo de como [as empresas] podem agir.”

O anúncio chega em meio ao início em Katowice, na Polônia, das discussões anuais da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre o clima. Os signatários do Acordo de Paris vão tentar chegar a um consenso sobre como implementar suas medidas a partir de 2020.

O mundo já aqueceu cerca de 1°C em comparação aos tempos pré-industriais, em grande medida em razão das emissões decorrentes da queima de combustíveis fósseis. O Acordo de Paris pretende limitar esse aumento da temperatura a bem menos do que 2°C.

O compromisso da Shell – o primeiro do tipo no setor de petróleo – é uma mudança significativa para Van Beurden. Ainda em julho, ele considerava criar metas rigorosas um exercício “supérfluo”, que deixaria a petrolífera exposta a processos jurídicos se deixasse de cumpri-las.

Van Beurden disse que mantinha “diálogo” com investidores e que isso levou a uma “evolução” na posição da Shell, sendo que as metas de curto prazo vão criar uma maneira mais eficiente e flexível de administrar a companhia em meio a uma transição energética que é marcada por incertezas e vai levar várias décadas.

A Shell está à frente de outras grandes petrolíferas concorrentes, como a britânica BP e a americana ExxonMobil, em seus compromissos públicos para reduzir as emissões de carbono. A ambição de longo prazo que havia sido anunciada pela Shell em 2017 também incluía emissões de terceiros, como os carros que queimam gasolina e diesel produzidos pela Shell.

A empresa agora tem como meta reduzir sua pegada de carbono líquida, incluindo as emissões de seus clientes, em torno a 20% até 2035 e vai começar a definir metas específicas a cada ano a partir de 2020 para o período seguinte de três a cinco anos.

A Shell pretende aumentar a proporção de gás em sua produção de 50% para 75%, investir mais em energias de baixa emissão de carbono e reduzir o vazamento de metano em seus poços, gasodutos e bombas.

A adoção de metas é apoiada pela Ação Climática 100+, um grupo de investidores internacionais com mais de US$ 32 trilhões de ativos sob gestão, que tem pressionado as grandes empresas poluidoras a reduzir as emissões e a melhorar a governança corporativa e a transparência em questões climáticas. Entre os integrantes estão o Sistema de Aposentadoria dos Funcionários Públicos da Califórnia (CalPERS), a Legal & General Investment Management e a UBS Asset Management.

São cada vez maiores as preocupações quanto aos riscos de se deter investimentos em empresas de combustíveis fósseis, não apenas por seu papel no aquecimento mundial, mas também porque os projetos de gás e petróleo poderiam se tornar economicamente desfavoráveis caso o mundo gire em direção a alternativas mais limpas.

A Shell também se comprometeu a reavaliar sua participação em grupos lobistas de petrolíferas cujas posições em questões ligadas ao clima possam enfraquecer as metas do Acordo de Paris – uma das preocupações dos investidores.

A empresa, assim como outras rivais da área de fontes de energia, está às voltas para descobrir como os investimentos em ativos de baixas emissões podem gerar receitas e dividendos similares aos de seus projetos tradicionais. Apesar de a Shell ser uma grande investidora em novas alternativas em comparação às concorrentes, ainda aloca a projetos de energia “limpa” apenas 8% de seus US$ 25 bilhões em investimentos anuais em bens de capital.

Fonte: Valor